terça-feira, 10 de julho de 2007

Pergunto ao vento que passa
notícias do meu país
e o vento cala a desgraça
o vento nada me diz.

Pergunto aos rios que levam
tanto sonho à flor das águas
e os rios não me sossegam
levam sonhos deixam mágoas.

Levam sonhos deixam mágoas
ai rios do meu país
minha pátria à flor das águas
para onde vais?Ninguém diz.

Se o verde trevo desfolhas
pede notícias e diz
ao trevo de quatro folhas
que morro por meu país.

Pergunto à gente que passa
por que vai de olhos no chão.
Silêncio -- é tudo o que tem
quem vive na servidão.

Vi florir os verdes ramos
direitos e ao céu voltados.
E a quem gosta de ter amos
vi sempre os ombros curvados.

E o vento não me diz nada
ninguém diz nada de novo.
Vi minha pátria pregada
nos braços em cruz do povo.

Vi minha pátria na margem
dos rios que vão pró mar
como quem ama a viagem
mas tem sempre de ficar.

Vi navios a partir
(minha pátria à flor das águas)
vi minha pátria florir
(verdes folhas verdes mágoas).

Há quem te queira ignorada
e fale pátria em teu nome.
Eu vi-te crucificada
nos braços negros da fome.

E o vento não me diz nada
só o silêncio persiste.
Vi minha pátria parada
à beira de um rio triste.

Ninguém diz nada de novo
se notícias vou pedindo
nas mãos vazias do povo
vi minha pátria florindo.

E a noite cresce por dentro
dos homens do meu país.
Peço notícias ao vento
e o vento nada me diz.

Quatro folhas tem o trevo
liberdade quatro sílabas.
Não sabem ler é verdade
aqueles pra quem eu escrevo.

Mas há sempre uma candeia
dentro da própria desgraça
há sempre alguém que semeia
canções no vento que passa.

Mesmo na noite mais triste
em tempo de servidão
há sempre alguém que resiste
há sempre alguém que diz não.


(A propósito disto.)

6 comentários:

Sofia disse...

Ter essa consciência, com tão pouca idade...
Como podemos sentir, se não estivemos lá?

Alexandre Pierson disse...

Bem, porque alguém que lá esteve e sentiu fez este poema para nós sentirmos também.

Sofia disse...

E se lermos um outro poema, que diga o contrário deste?

Alexandre Pierson disse...

Bem, se me conseguires arranjar um, poderemos discutir... Mas será mesmo possivel produzir um poema tão intenso louvando a ditadura, a interdição de falar, pensar e sentir?

Sofia disse...

Não me parece que seja. Mas a razão é simples: A poesia implica paixão. No seu sentido mais lato.

E parece-me pouco provável que alguém que aprecie a ditadura possa possuir essa paixão.
Até porque, paixão é dar. É querer partilhar. E a ditadura só tira, só exige.
No entanto, esse facto não implica, obrigatoriamente, que não possa ter aspectos positivos. Ou que não possa ser usada a nosso favor.

Alexandre Pierson disse...

Paixão é vontade desmesurada de dar e de partilhar? Nunca tinha pensado nisso nesses termos, mas se calhar tens razão...